domingo, 7 de outubro de 2012

Nós somos o manicómio da Europa


Na crónica de ontem no El País, o escritor Manuel Rivas recorda aquilo que Roberto Bolaño disse numa entrevista de 2002; que a América Latina era como o manicómio da Europa. Dez anos depois, parece evidente, a Europa já não precisa de olhar para o outro lado do mar para ver as suas doenças psiquiátricas. Tem-nas levedando dentro de casa. Tornou-se bipolar, esquizofrénica, maníaca, deprimida, obsessiva, compulsiva, esgotada... Também nós, aqui, como Bolaño noutro tempo e noutro continente, sonhámos utopias e acordamos do sonho gritando, angustiados e com punhos trancando-nos a garganta.

Comprei o El País, pensei eu, por muito boas razões: é o melhor jornal do mundo e, ao contrário do que sucede com os matutinos nacionais, não corremos o risco de chocar de frente com mais algum anúncio daquilo que vamos ter que pagar para benefício de não sei o quê, de não sei quem (e já nem sei porquê). Evitaria, supus eu, ter vontade de ficar a riscar as caras dos filhadaputinhas com uma BIC Cristal (para escrita fina), até que o papel se rasgue e seja uma pasta só, ou de furar-lhes os olhos com a ponta acesa da cigarrilha.

A estratégia, porém, não se revelou particularmente eficaz. Logo por baixo da crónica de Ribas, que me fez pensar neste país como o manicómio da Europa, como um antro de chalados e celerados, vinha um texto sobre um indivíduo que se chama Cristóvão Colombo (Cristobal Colón) e que fabrica iogurtes em Girona, os melhores iogurtes do mundo, que têm a particularidade de serem também produzidos por doentes mentais. E na capa vem a notícia de que o Governo espanhol, enquanto decide se se entrega ao resgate que há-de também ali foder os mais pobres & e a conomia em geral, determinou que as casas ilegalmente construídas em domínio público, à beira-mar, já não vão ter que ser derrubadas até 2018, permitindo aos cabrões abastados que as construíram que ali fiquem por mais 75 anos, ocupando para seu benefício exclusivo terras que deviam ser de todos.

Pareceu-me esta notícia, e nem sei bem porquê, eu já não sei de nada, pareceu-me, dizia, uma espécie de paradoxo desta nova Europa xarope de todo, que tira aos que têm menos para dar aos que mais roubam. E ainda estava a pensar nisto quando reparei que também no El País, no melhor jornal do mundo, vão avançar para despedimentos, cortes de ordenados, reformas antecipadas, invocando-se ali, como num sítio que eu conheço, a mesma necessidade de ajustar a estrutura de custos e de fazer face à diminuição da publicidade, à perda de leitores e a todo o habitual cortejo de desgraças que grassam no manicómio, nesta terra louca, doida, ensandecida.