terça-feira, 9 de outubro de 2012

A gata do Manuel António Pina



Quase nunca consigo recordar-me daquilo que sonho durante a noite. Acordo com a vaga percepção de ter estado a laborar em coisas muito bizarras, mas dificilmente retenho algum pormenor que valha a pena (mais interessante, digamos assim, do que haver alguém a fazer xixi dentro de gavetas). Esta noite, porém, tenho a certeza de que sonhei uma coisa qualquer que, a dado passo, envolvia um gato. Ou melhor: uma gata. Para ser mais exacto, era uma gata do Manuel António Pina, um dos vários, proverbiais e inconcretos felinos que convivem com o poeta e povoam os versos dele. No sonho, eu ia passar a conviver com essa gata, que tinha sido encarregue de cuidar de mim. Tenho a certeza de que não era o contrário. O Pina não me tinha pedido para tomar conta da gata. Era a gata que ia tomar conta de mim. Bem vistas as coisas, acabava por fazer todo o sentido que assim fosse. Os homens bons, e os seus gatos, não existem senão para dar conforto aos que são mais fracos.