sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Grandes Marmelos


Não sei nada, ao certo, sobre as origens do meu peculiar sobrenome, herdado de um avô de Castelo de Vide. Nunca foi assunto discutido em família, embora, pela tradição judaica daquela vila norte-alentejana, e por ser prática comum, em certas épocas, que os antigos judeus fossem obrigados a converter-se ao catolicismo, adquirindo, no processo, nomes de árvores e de frutos, me tenha parecido sempre mais ou menos óbvio de onde me viera o apelido.

Hoje, numa pesquisa simples ao arquivo digital da Torre do Tombo, descobri que, em 1569, um tal João Lopes Marmelo, natural de Elvas, foi julgado pelo Tribunal do Santo Ofício de Évora, acusado de "judaísmo, heresia e apostasia". Também encontrei um Marmelo de Foz Côa acusado de "proposições heréticas" pelo mesmo santo tribunal, bem como várias referências a Marmelos em processos da PIDE, o que talvez signifique que, noutros tempos, éramos gente de tomates.

Fui, portanto, tomado de um vago orgulho desses meus possíveis antepassados, ainda que o que mais me emocionou tenha sido uma fotografia do jornal O Século, de Fevereiro de 1935, da qual consta uma comissão de castelvidenses que visitou, suponho, a redacção daquela extinta publicação. Do lado direito da imagem lá está o meu velho tio Luís, que chegou a ser o mais velho bombeiro português em actividade (combateu fogos até depois dos 70 anos). Reconheci-o imediatamente: o mesmo homem que, já velhinho, descia do alto de São Roque só para me vir buscar para lanchar; o velho Luís Maria Marmelo que só fumava Kentuky e que recusou um volume de SG Gigante que lhe levei uma vez.

Quando, uma vez ou outra, regresso a Castelo de Vide, tenho sempre saudades do meu tio Luís.