sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A propósito das primeiras frases de "El Ojo Silva", do livro "Putas Asesinas", de Roberto Bolaño

"O que são as coisas. Mauricio Silva, conhecido como O Olho, sempre tentou escapar à violência mesmo correndo o risco de ser considerado cobarde. Mas da violência, da verdadeira violência, não se consegue fugir, pelo menos nós, os nascidos na América Latina na década de 1950, os que tínhamos vinte anos quando morreu Salvador Allende".*

Assim eram, pois, as coisas. Leio-o e interrogo-me sobre o que leremos, daqui a trinta anos, que venha a ser escrito por aqueles que, nascidos em Portugal nas décadas de 1980, 1990 e posteriores, sempre terão tentado fugir ao desemprego, à insegurança, à falta de perspectivas de vida. Penso nisso, dizia, e ocorre-me que também os meus filhos (perdoem-me, se puderem) estarão um dia, como os latino-americanos daquele tempo, a escrever a partir do exílio. Se tiverem juízo, estarão também a escrever num idioma qualquer que se fale em países a sério. Esta merda não tem remédio.**


*tradução caseira
** trata-se, bem sei, uma previsão falível, mas não mais falível do que era a frase daqueles cavalheiros que, há mais de cem anos, escreveram que isto é uma choldra e continuam absolutamente actuais