sexta-feira, 9 de maio de 2014

A melhor filha do mundo e arredores

Há vinte e um anos e algumas horas fui pai pela primeira vez — um pouco inconsciente e um pouco louco, e também assustado com a possibilidade de gerar mais um ser humano para viver num mundo estranho, tantas vezes hostil, perigoso, injusto e cruel. Não sei muito bem como foi que isto me aconteceu, mas acabei criando a melhor filha do mundo: meiga, independente, companheira, bonita, singular, inteligente, combativa, consciente, amiga e com uma personalidade à prova de bala.

Tenho o privilégio, aliás, de ter dois filhos absolutamente incríveis — digo-o a toda a gente, mas creio que nunca lhes disse a eles, o que talvez constitua o pior dos meus defeitos. Não sou eficaz a exprimir os sentimentos e creio que algumas pessoas nunca chegam a perceber o quanto gosto delas (e algumas são incapazes de o compreender mesmo que o diga muitas vezes, o que não chega a ser um paradoxo: é apenas uma tremenda perda de tempo). Mas há nos filhos alguma coisa que os torna diferentes dos outros. Parece que compreendem o meu problema de expressão e que sabem que, à minha maneira, os adoro para além das palavras que não digo.

Daqui a pouco, quando ela acordar com 21 anos completos, vou abraçar a Maria Miguel e dar-lhe os parabéns. É possível que, outra vez, não seja capaz de lhe dizer tudo o que ela merece. Mas tenho a certeza de que, não sei como, ela vai perceber o quanto lhe quis dizer e não soube. E que estive a chorar enquanto escrevia este desabafo torpe e sincero como uma confissão.