terça-feira, 14 de maio de 2013

O silêncio

De entre todos os animais selvagens que já tive a oportunidade de observar cara a cara, houve dois que me impressionaram particularmente: a raposa e o peixe-boi.
O mamífero aquático brasileiro, que vi dentro de uma piscininha perto do Forte Orange, em Pernambuco, assemelhava-se a uma grande massa mineral, um naco de pedra inerte e cego. Parecia incapaz de manifestar qualquer tipo de vontade ou mesmo de executar tarefas mais simples, como ver, escutar ou emitir ruídos.
A raposa é, aparentemente, bastante diferente. Vi uma, há bastantes anos, dentro de uma das jaulas que existiam nos Jardins do Palácio de Cristal, e tudo nela parecia demasiado vivo: as orelhas aguçadas, o dorso ágil, a cauda extravagante e os olhos contundentes como chamas, agressivos, daninhos. Não sei bem que sentimento me inspirou o olhar furtivo da raposa, mas talvez tenha sido uma espécie de medo interior, inexplicável e irracional.
O que, porém, mais me impressionou em dois animais tão diferentes foi o profundo e inquietante silêncio que ambos inspiram. Trata-se, se calhar, de um equívoco. Mas há nos olhos excessivamente vivazes da raposa e na absoluta inexpressividade do peixe-boi alguma coisa que parece dispensar o ruído, o grito, o som, o tumulto, a conversa da treta e a barulheira em geral. Hei-de, por isso, meditar no exemplo deste dois bichos — a ver se aprendo alguma coisa.