segunda-feira, 16 de novembro de 2009
Aos bochechos
Incomodam-me um pouco a falta de rigor e a imprecisão, sobretudo quando a falta de rigor e a imprecisão dão origem a citações que multiplicam a falta de rigor e a imprecisão. O exemplo que, assim de repente, me ocorre é o do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento, o qual, acossado pelos microfones, lamentou que as certidões relativas às escutas das conversas entre José Sócrates e Armando Vara cheguem “às bochechas”. Isto foi o que o juiz disse, mas os jornalistas, na ânsia de normalizar, entenderam que o juiz queria dizer “aos bochechos” e escreveram-no e reproduziram com grande abundância esta versão revista da realidade. Não ponho em causa que o douto Noronha Nascimento tenha realmente pretendido dizer “aos bochechos” quando disse “às bochechas”, nem sei se isto interessa realmente. O que me inquieta, a bem dizer, é que os órgãos judiciais que devem validar ou não as ditas escutas andem há meses a tomar decisões aos bochechos, a anunciá-las às pinguinhas e a revelar apenas pedacinhos de conversas que, se tivessem sido conhecidas em tempo útil, talvez ajudassem a ter uma ideia mais aproximada, e menos parcial, do sujeito que os portugueses escolheram para ser primeiro-ministro. Eu, concedo, não tenho que ter conhecimento das conversas pessoais do indivíduo que governa o país, mas, se calhar, convém-me saber se o homem for um refinado crápula e um mentiroso contumaz.