Segundo o JN, os desalojados na Lourinhã pelo mais recente temporal atribuíram "o caos", como é costume, à influência do maligno, que tem as costas proverbialmente largas. "Foi horrível, foi impressionante", descreveram. "Parece que andava aqui o diabo".
Não creio, porém, que exista qualquer demonstração da influência do demo na degradação das condições climatéricas, sequer na muitíssimo exaustiva literatura que os séculos mais beatos nos legaram. Apesar do adágio popular que diz "Fevereiro quente, diabo no ventre", nem Santo Agostinho, que dedicou extensa reflexão ao animal, se refere, creio, a tais artes do chifrudo - e até assevera que "o demónio não pode fazer mais do que aquilo que lhe é permitido por deus" (mas Agostinho desconhecia a cerveja e julgava que os homens só podem comer trigo se o triturarem para fazer pão; não se deve confiar demasiado num indivíduo que nunca provou uma das weiss do meu amigo Neves).
O diabo, se existisse - e há tantas provas disso como da chuva de criptomoedas no Alandroal ou da própria veracidade da ideia de deus -, haveria de se entreter com actividades mais substanciais ou subversivas, como a perdição das almas (de quem as tenha), as libações entorpecentes ou a produção de novas deleitáveis tentações.
Daí que o mafarrico, se alguma vez tivesse transitado pela Lourinhã, não perderia tempo com ventanias, raios e bátegas. Criaria, quando muito, a variante local do cognac, bailaria um corridinho e, se lhe sobrasse tempo, espargiria a terra com a semente das mais curvilíneas criaturas em que um sáurio pudesse enterrar o dente.