quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Madrugada

Não sei se é o frio que me acorda, ou o pacífico silêncio absoluto das ruelas do antigo bairro judeu. Desperto demasiado cedo e percebo a alvorada infiltrando-se pela frincha da portada, os primeiros rumores distantes da vila, a rósea luz nascente revelando os campos que a branca geada cobriu. Imagino um poema que estará esquecido quando passar a manteiga no pão de ontem. Saio para encher o corpo deste gelado ar puríssimo e observar de perto os perfeitos cristais de gelo que a noite depositou nas pedras dos muros, na terra, na erva crescida em torno das oliveiras, no pavimento da estrada municipal. Não sinto o frio enquanto persigo os badalos dos borregos, nem mesmo me incomoda o vento Leste enquanto o sol mal se firma acima do horizonte ancho de montanhas suaves.