quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Auto da inoculação










Um ano transcorrera entretanto e o diabo continuava imperturbável em seu posto no cais, vendo como vinham e iam sucessivas vagas de inoculados, provocando-os a seu bel-prazer.

DIABO: Que vos disse eu, arrenegados, fideputa cabrões? Melhor faríeis em estar quietos, alheios às libertações. Se quereis vacinas, tomai-as! Mas cuidai de apertar os calções. Que o vírus é como um mar, tem maré de ir e voltar. Acaba a delta e vem outra, só para t'amofinar.

INOCULADO DA PFIZER: Mas se fiz o que ordenaram especialistas e regentes, hei-de agora quedar à mercê de testes e reagentes?

DIABO: Nem mais nem menos, pois é. Vai para fila e aguenta, à chuva, ao frio e de pé, que a dança deste Covid não é para qualquer Zé. Se um almirante te enrola, e aspira a ser presidente, não vejas, na vaga, marola, e tem o que digo presente: a imunidade de grupo não é senão passageira, tomai-a e bebei todos e afastai de mim tal canseira.

INOCULADO DA PFIZER: Dizeis que a doença malina aumenta e não tem parança?

DIABO: Nem mais nem menos, que dança! Enquanto uns esticam o braço, para tomar a vacina, outros enchem a pança conforme o Diabo ensina. E engordam, os vendilhões, com PCR e antigénio, que para mamar à farta não é preciso ser génio. Vai p'ra fila, vai p'ra bicha, ao menos por mais um decénio, que esta doença gira, dá voltas no ar e rebenta. Parece o Adamastor que as terras virgens alenta: dá três voltas no ar, no rabo do fim do mundo, e volta a contaminar a todos em meio segundo.

INOCULADO DA PFIZER: O que hei de então fazer, se as ordens são tantas, e as vacinas e testes não são remédio nem santas?

DIABO: Folgar, comer e beber, é a minha receita de sempre. Comigo tudo é eterno e o vírus há-de tardar a chegar ao inferno para contaminar.

INOCULADO DA PFIZER: Rais'parta, tou como hei de ir! Então a doença de agora é só uma cousa de rir?

DIABO: Se te deves rir não sei, faz é como antigamente: bife, vinho e mulher, com um pouco de aguardente. Melhor remédio não há, nem aqui nem no Peru; deste modo não há-de o vírus ter tempo de te ir ao cu.

INOCULADO DA PFIZER: Melhor conselho não vejo, que tudo já me confunde. E o meu cu tem traquejo, naquilo que o Diabo infunde. Entre imposto e imposto, mais taxas e o ataúde, antes viver quando é tempo do que temer amiúde. Beber, tragar e folgar, é pois o que eu vou fazer. Se o vírus houver de chegar,  já não há-de ter que comer.

DIABO: Sábias palavras proferes, ó tão crédulo cidadão. Toma a vacina à cautela, que não te custa um tostão. Levas fiado e pagas na próxima contravenção. Não há vacinas no céu, nem almoço sem provento, mas toma cuidado e não votes nalgum cabeça de vento. Quem no rio se aventura, pena depois com fartura.

INOCULADO DA PFIZER: Bem sei, diabo gentil, tão nosso amigo e sincero. É melhor votar em branco e que fiquem zero e zero.