terça-feira, 20 de junho de 2023

Os mais cruéis prazeres


Um estudo realizado pela Universidad Miguel Hernández acaba de demonstrar que, quando contemplam O Jardim das Delícias, de Bosch, os visitantes do Museu do Prado se sentem particularmente atraídos pela parte do tríptico que representa o Inferno. Dedicam, para sermos mais exactos, 33,2 segundos a cada metro quadrado dessa parte da pintura, o que compara com os 26 e os 16 segundos gastos com cada metro quadrado da vida terrena e do Paraíso, respectivamente.

É impossível saber se Bosch pretendeu, ao pintar o tríptico, que o Inferno e os seus cruéis habitantes, à direita de quem olha, atraíssem mais atenções, mas parece certa a propensão humana, mesmo que reprimida, para o abismo, o negrume e o desconhecido. Que o digam os cinco milionários aventureiros que seguiam a bordo de um submarino turístico dedicado a visitar os restos do Titanic no fundo do Atlântico. A embarcação desapareceu dos radares e encontra-se agora em parte incerta, se calhar fazendo companhia aos destroços do malogrado paquete.

Ali, no mais inóspito abismo, no fundo do oceano, esses turistas do desconhecido talvez tenham podido pressentir que cumpriam uma espécie de destino ou um encontro inevitável com o escuro mais escuro de si mesmos. Mirando pela escotilha, como no poema de Baudelaire, gozaram daquele infinito os mais cruéis prazeres — pagos a peso de ouro, já agora.