quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Tenho-me sentido um pouco estranho. Deve ser crometofobia.


Vários órgãos de comunicação social do mundo inteiro têm dedicado trabalhos ditos jornalísticos a uma terrível patologia, "asfixiante" e até passível de "levar ao alcoolismo e ao suicídio". A maleita, ainda não reconhecida pela OMS, consiste num medo excessivo de gastar dinheiro e tem um nome a preceito: crometofobia.

Às voltas com os meus botões, ocorre-me inevitavelmente que este "transtorno mental" há-de já estar cavalgando a pátria como fogo em pasto seco, tal a quantidade de gente que vejo lamuriando-se dos preços no supermercado, quase contando os trocos para comprar o pão e a massa, os ovos e o café. Talvez até já seja um problema de saúde pública e eu próprio, às vezes, me tenho sentido um pouco estranho.

Amiúde, confesso, evito gastar o que tenho e o que não tenho, e é com certo receio que consulto o saldo do banco a fim de constatar que não me é conveniente desbaratar mais fundos. Não troco as lentes dos óculos há mais de três anos, embora enxergue cada vez pior, evito visitar o dentista, o oftalmologista, as livrarias, os pronto-a-vestir, os parlours e os botecos. E estes sintomas, leio no site da insuspeita BBC, "devem persistir por vários meses e ser suficientemente graves para causar uma deterioração significativa das relações pessoais, familiares, sociais" e etc.

Valha-nos que o Governo está atento e não dorme. No mês que vem, se não houver atrasos, distribuirá pelas contas bancárias da nação um bodo de 125 euros, fundamental não só para fazer face à cavalgada da inflação, mas também para combater algumas manifestações mais agudas da crometofobia. Pela parte que me toca, prometo não o gastar insensatamente. Em vinho ou assim.