Tendo em conta a gravidade das circunstâncias actuais, a posição do PCP relativamente à invasão militar da Ucrânia pela Rússia não passa de escuma — daquela escuma tão leve que qualquer brisa levanta e dissipa. Esta é, todavia, a minha última homenagem a um moribundo, pelo que não quero deixar de a expressar de modo tão veemente e comovido quanto possível.
O PCP, entenda-se, é livre de adoptar as posições que entender mais convenientes. Beneficia, para isso, do facto de ser um partido político protegido pelas leis de um país democrático (as mesmas leis que protegem as mentiras mil vezes repetidas da IL ou do partido cujo nome não reproduzo). Nem sempre foi assim, sabemo-lo, e a história está repleta de mártires comunistas que deram a vida em defesa dos seus ideais de justiça e equidade. O argumento, porém, segundo o qual a invasão russa da Ucrânia pode ser (pasme-se) justificada pelo facto de o governo ucraniano ter alegadamente "integrado nazis nas forças armadas" é simplesmente bizarro, tão infantil que chega a ser penoso lê-lo.
Sabe-se que os fascistas europeus, racistas e xenófobos, têm vindo a integrar o governo de vários países europeus, como a Áustria, a Itália, a Holanda e a Dinamarca. Em nenhuma destas circunstâncias me lembro de ter ouvido o PCP a defender a invasão militar daquelas nações — desde logo porque seria estúpido e ridículo. A que propósito, então, o PCP decidiu alinhar com a putativa campanha russa de "desnazificação" da Ucrânia, desde logo quando se sabe que também o exército e a polícia ou o Parlamento portugueses integram elementos que alinham por ideias de extrema-direita? Deverá a Espanha invadir-nos? As Berlengas?
Os comunistas de outros tempos, defensores da liberdade e da justiça, estariam hoje nas trincheiras ao lado daqueles que procuram defender a independência de um Estado de Direito democrático na Ucrânia. Sucedeu, por exemplo, na Guerra Civil de Espanha. O PCP, todavia, acaba de renegar os seus princípios fundamentais. Depois de ter sobrevivido trinta anos, e contra o vaticínio de muitos, à queda da União Soviética e do Bloco de Leste, vai agora sucumbir por ter defendido um regime autoritário, fascista e que vive descaradamente para manter os privilégios de uma minoria de plutocratas ultra-ricos, em detrimento dos milhões e milhões de pobres e proletários russos.
Trata-se de uma trágica ironia e de um fim que não é bonito nem digno para todos aqueles que lutaram, acreditaram e acreditam nos belos ideais do comunismo. Paz à sua heróica memória.