Compreendi, nos primeiros dias da invasão russa da Ucrânia, que as gerações mais novas dispensam as notícias e as reportagens da guerra, recorrendo, em vez disso, aos vídeos disponibilizados na aplicação Tiktok. Acedem, assim, a imagens directamente transmitidas a partir das diversas frentes de batalha pelos jovens soldados de ambos os lados, sem qualquer mediação ou filtro que separe a informação da propaganda. A minha filha contou-me também que os russos não se coíbem de usar a rede social de engate Tinder para procurar ucranianas que lhes possam aliviar o stress da guerra, numa prática provavelmente tão antiga como a Humanidade, mas que adquire agora, digamos assim, uma nova dimensão.
Não me debruçaria, porém, sobre as práticas recreativas dos maçaricos russos se não tivesse ontem visto na RTP2 o documentário "Wars don't end", de Dheeraj Akolkar, dedicado ao drama das crianças norueguesas nascidas durante a II Guerra Mundial, fruto de relações entre ocupantes alemães e mulheres norueguesas. Quando o invasor foi afastado, essas crianças viram-se maltratadas, violadas em grupo, discriminadas, internadas à força em manicómios e até oferecidas como mão-de-obra ao Governo da Austrália, pura e simplesmente por carregarem no sangue aquilo a que os noruegueses, supostamente civilizados, designavam pela expressão "genes nazis". O estado norueguês não só foi incapaz de proteger essas crianças, para as quais a guerra nunca acabou, como terá sido cúmplice da torpe vingança.
Em diferentes graus e matizes, sucedeu em muitas outras guerras e ocupações. Pode suceder agora outra vez e não será decerto este texto rebarbativo a evitá-lo. Mas não custa nada tentar recordar que as pessoas não são responsáveis pelas guerras dos seus países e que os filhos delas o são ainda menos ou mesmo nada.