O ar exterior, dizem os avisos da protecção civil, não deve ser respirado por velhos, crianças e doentes. Por uma vez, e espero que sem exemplo, sinto-me abrangido pelo aviso e só com velados cuidados franqueio a portada da sala para consumir uma cigarrilha ou outra, e para que alguma livre revoada circule pela casa e revolva os miasmas eventualmente acomodados junto aos rodapés, nas dobras das cortinas ou na vastidão do corredor que a luz amarela do astro sujo mal ilumina. Impedido de sair, ocorre-me que um Proust, um Pynchon ou, vá lá, um Trevisan, aproveitariam a reclusão para trabalhar incansavelmente, produzindo alguma obra-prima que os vindouros pudessem admirar sem ler. Eu, pelo contrário, aproveito para, pela primeira vez em várias décadas, passar um dia inteiro de pijama — coisa tão desprovida de graça. De muito melhor catadura me acharia agora mesmo em calções, correndo as minhas pernas esquálidas e débeis pelas ruas da cidade que a poeira africana lentamente recobre. Antes morrer com os pulmões saturados da areia de outro continente, de outras vidas, do que envergando o pijama vestido na véspera. Coisa mais triste, ché.