quarta-feira, 25 de março de 2020

Testar, testar, testar

Que refrescante foi ver a filha da doutora Fátima Felgueiras a descer ao subsolo do jornalismo real para participar numa conferência de imprensa e mostrar aos colegas que não se sente obrigada a respeitar as mesmas regras a que os outros se submetem, que imbecis são estes jornalistazitos que vão todos os dias aos ministérios fazer perguntas de forma ordeira e educada, incapazes de conferir ao acontecimento o subtil dramatismo que insinue a iminência de uma pérfida conspiração governamental. E que agradável foi ver os outros órgãos de comunicação social a obedecerem à agenda da moça pesporrente e a darem todos a mesma notícia, a organizarem fóruns para que o cidadão comum possa dizer larachas à vontade e demonstrar que a estupidez e a ignorância são, efectivamente, as coisas mais bem distribuídas do mundo.

Desconheço, claro, se os testes feitos à Covid são suficientes, razoáveis, racionados ou racionalizados. Não sou médico nem tenho de gerir o caos decorrente da pandemia e da histeria exaltada dos jornalistas. Mas parece-me pouco produtivo que o maior entretenimento nacional destes dias consista em dar voz a qualquer bicho careta disponível para duvidar e pôr em causa as orientações das autoridades de saúde. Não entendo, e a sério que não entendo, que um médico especialista que passou anos a estudar os vírus e o seu modo de funcionamento disponha, nos telejornais, do mesmo tempo e dignidade concedidos a qualquer Zeca que queira dizer todo o contrário sem qualquer tipo de contraditório, pois ninguém no seu perfeito juízo se detém para ponderar sobre a razoabilidade desta prática ou para questionar o agente de uma boa polémica capaz de dar emoção a uma emissão televisiva ou duas.

Também não entendo, juro que não, o jornalismo pós-moderninho e sexy que se dedica, nestes dias, a dar voz a turistas (eles preferem que lhes chamem viajantes) que ficaram retidos em países muitíssimo exóticos enquanto andavam a laurear a pevide em pleno surto pandémico. Queixam-se, os pobrezinhos, de que o governo não os repatria imediatamente e, de preferência, à custa dos outros contribuintes todos, aqueles parvos que não foram passear para a Indochina ou para a Guatemala e se têm de contentar com as filas de domingo a caminho das marginais.