quarta-feira, 3 de maio de 2023

A quinta de Tchaikovsky (em busca do santo graal)


Li algures que uma mulher desfrutou de um orgasmo há dias — calmai-vos, cafajestes — durante um concerto da orquestra filarmónica de Los Angeles. Tendo-me parecido séria a fonte da notícia, procurei, ainda assim, confirmá-la junto de outras fontes idóneas. Fiquei deste modo a par de que o amplexo ocorreu durante a interpretação da quinta sinfonia de Tchaikovsky, na sexta-feira, e que a miraculada terá entretanto declarado que se tratou de "uma expressão física de pura felicidade", escutada, entre outros, por um dos irmãos do actor Ralph Fiennes (que depois o tuítou). 

Escusado será dizer que de pronto me ocorreu escutar a quinta sinfonia do compositor russo, procurando detectar em que cume musical daqueles 45 minutos eclodiu a pura felicidade da senhora (talvez a marcha triunfal do último andamento, a fúria dos cossacos na estepe, possam explicá-lo, mas que sei eu?). A quinta de Tchaikovsky é, todavia, apenas o que é, às vezes heróica, às vezes ambiental, em quatro andamentos que o próprio autor descreveu como uma "completa resignação à fé".

Resignado, também eu, a crer na explosão da pura felicidade da melómana, no milagre da música feito carne e grito, penso que no corpo da quinta de Tchaikovsky (é de valor) há-de correr, como na Poesia-orgasmo do Ary dos Santos, "o sangue das artérias do universo"; em cada nota soar "um grito/um murmúrio um gemido uma erecção/que transporte do humano ao infinito/a dor o fogo a flor a vibração". Querendo testá-lo, cafajestes, experimentai-o à vontade nas vossas próximas incursões licenciosas ao cálice sagrado. Mal não há-de fazer e sempre evitais ter de pôr sempre a tocar o Je t'aime moi non plus ou os vídeos do Buereré que os miúdos gravaram in illo tempore.