Elon Musk, o milionário da Tesla, terá afirmado numa rede social que já descarregou o conteúdo do seu cérebro para uma cloud. Se se exceptuar a complexidade técnica do processo, Musk ter-se-á limitado a imitar aquilo que os ricos fazem desde há séculos: vivem como cabrões e, mesmo assim, procuram garantir um lugar no céu para toda a eternidade (seja lá o que isso for), comprando-o.
Outrora, se bem compreendi o truque, o lugarzinho garantia-se com rezas e com doações à Igreja e às suas misericórdias. Agora, pelos vistos, o processo dispensa a intermediação da fé — da fé religiosa, pelo menos —e assenta na possibilidade tecnológica de prolongar artificialmente a vida física, depositando o conteúdo do cérebro no paraíso do metaverso, onde os bem-aventurados poderão até continuar a fazer compras digitais com criptomoedas. Compra-se espaço numa nuvem informática e já está: o cérebro, ou a sua cópia digital, continuará a existir durante muito tempo ou, pelo menos, até que alguém lhes desligue a ficha da tomada.
Não deixa de ser curioso, por outro lado, constatar de que modo se assemelham as iconografias das duas religiões. A mais antiga promete o além sob a forma de uma improvável nuvem celestial, onde os que serão salvos viverão à direita do pai e aí desfrutarão de todas as delícias. Já a recente fé na tecnologia digital mantém o imaginário da nuvem e da vida eterna, embora sob a forma de bites e bytes (gigas e teras deles) e insinuando que a bem-aventurança dependerá da quantidade de dinheiro virtual que cada um seja capaz de amealhar durante a vida terrena.
Num caso e no outro, é a minha suspeita, os maiores beneficiários do esquema são, então como agora, aqueles que amealham em vida o dinheirinho real que resulta das respectivas devoções. Que o digam os anjinhos que entregaram os depósitos ao espírito santo (ou a criptobancos já falidos) e se acharam, no fim, com duas mãos cheias de nada. Ou os que doaram (quase) tudo à Igreja e morreram tão simplesmente como outros quaisquer.