Partilho a história tal como ontem me foi contada pelo professor Paulo Canário entre cervejas e tremoços.
Durante os anos 1930, a propaganda do PCP terá feito chegar às inúmeras filarmónicas portuguesas a partitura d'A Internacional, a marcha composta em 1888 por um belga, Pierre Degeyter, a partir de um poema do francês Eugéne Pottier inspirado pelo esmagamento da Comuna de Paris. Proibida pelos regimes de Salazar e de Franco, a música servia então de hino da União Soviética, mas este dado não seria revelado na pauta.
Consta, pois, que o incauto regente da Banda União Artística de Castelo de Vide, tendo apreciado a vivacidade da composição, o entusiasmo heróico dos seus acordes, decidiu ensaiá-la com os músicos e integrá-la no repertório habitual da filarmónica criada em 1881. Num aziago momento histórico, marcado pela ascensão do nazismo e pelo triunfo sangrento dos franquistas em Espanha, quis o deus das coincidências que a União Artística tivesse sido convidada para abrir a procissão da Semana Santa de Valencia de Alcantara, aqui ao lado, mas situada numa das mais reaccionárias e sanguinárias regiões de Espanha.
Não tendo sido ainda capaz de encontrar qualquer referência a este episódio (mas talvez a isso me dedique algum dia), posso apenas imaginar a impressão que terá causado aos beatíssimos fascistas espanhóis ver o cristo seguir pelas ruas ao som da proibida, da diabólica marcha dos comunistas. Há-de ter sido uma coisa bonita de se ver.