sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Em busca do Murakami selvagem


Antes Que o Café Arrefeça
, de Toshikazu Kawaguchi, há várias semanas nos tops de vendas nacionais, é só o mais recente exemplo doméstico do concurso mundial para encontrar o próximo fenómeno de vendas nipónico — ou o próximo Murakami selvagem, para parafrasear um título do autor de best-sellers. Chegou anunciado como “livro-fenómeno japonês” e prometendo uma história “tocante e inspiradora”. 

O sucesso foi quase instantâneo e não faltará quem garanta que Kawaguchi tem tudo para ser o novo Murakami (infelizmente, e pelos motivos habituais, o mundo editorial nunca parece muito interessado em descobrir o próximo Youkio Mishima, já para não falar no próximo Kawabata Yasunari ou no próximo Kenzaburo Ōe, prémios Nobel da Literatura em 1968 e 1994, respetivamente). 

Enquanto se espera para ver se a persistência de Kawaguchi nos tops de vendas confirma (ou não) o nascimento de um novo fenómeno global de popularidade, os meios de comunicação social internacionais não descansam e continuam, com uma regularidade impressionante, a elaborar listas de novos candidatos ao título de novo Murakami (ou, pelo menos, dos “dez autores contemporâneos japoneses que é absolutamente necessário conhecer”). 

A revista Books & Bao, por exemplo, mantém uma lista atualizada dos melhores livros japoneses em tradução para a língua inglesa. Para 2021, as apostas vão para Heaven, o novo romance de Mieko Kawakami, à espera de confirmar o sucesso de Breasts & Eggs, mas também para I-Novel, de Minae Mizumura, ou para Lonely Castle In The Mirror, de Mizuki Tsujimura, que até vai ser vertido para o Inglês por Philip Gabriel, o mesmo tradutor que se costuma ocupar dos livros de Murakami. Da lista constam ainda The Woman In The Purple Skirt, de Natsuko Imamura, Terminal Boredom, as histórias de ficção científica da celebridade Izumi Suzuki, Soul Lanterns, de Shaw Kuzki, ou At The End Of The Matinee, de Keiichiro Hirano. Mas a lista também inclui, claro, o mais recente Murakami, First Person Singular, talvez para demonstrar que ainda não inventaram ninguém melhor do que Murakami para agradar aos indivíduos alérgicos à leitura de frases compostas. 

Uma lista semelhante, mas do ano de 2018, da Tokyo Weekender, constavam os nomes de Yoko Tawada, Tomoka Shibasaki, Hiromi Kawakami, Sayaka Murata, Toshiki Okada, Risa Wataya, Mieko Kawakami, Yukiko Motoya, Hideo Furukawa e Toshiyuki Horie. Sim, o único nome que se repete é o de Mieko Kawakami. 

Aqui mais perto, a Espanha, já chegou Agujero (The Hole, na versão inglesa), de Hiroki Oyamada, que venceu em 2014 o Prémio Akutagawa e que o crítico Manuel Rodríguez Rivero classificou como “um estupendo romance curto”, surreal, no qual se percebe a influência de Kafka e Lewis Carroll. 

Na crista da onda japonesa está outros dos nomes presentes na lista da Books & Bao, o Nobel de 2017 Kazuo Ishiguro, cujo Klara and The Sun está entre os treze finalistas ao Booker Prize deste ano e também já chegou a Portugal pela mão da Gradiva. Mas é pouco provável que Ishiguro ainda seja candidato ao título de novo Murakami. O mais provável é que comece, não tarda, a busca pelo próximo Ishiguro.