quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O grito da menina vestida de verde



As fotografias não têm som, mas a imagem que Massoud Hossaini ontem captou em Cabul, no Afeganistão, após um ataque bombista, parece capaz de nos obrigar a levar as mãos aos ouvidos para tentar abafar o grito daquela menina vestida de verde. Está rodeada dos corpos semeados pela explosão, sangra de uma ferida na cabeça, as calças sujas de sangue, as mãos sujas de sangue e terra – e as mãos dela gritam quase tanto como a boca aberta num ricto de horror. Em outra imagem da mesma sequência, a menina continua gritando, na mesma posição, enquanto uma mulher de preto fala ao telemóvel, como se a dor e o absurdo a tivessem transformado numa estátua imóvel e dura, numa estranha obra de arte. Olha-se para a menina de verde e é como ver o Grito de Edvard Munch elevado ao paroxismo do mais hiperbólico terror, o Grito entre corpos deixados em posições desarmadas e estúpidas, como bonecos devastados pela ira de uma criança. Não se ouve o grito, mas escuta-se distintamente o grito. E quem leva as mãos aos ouvidos somos nós.