quarta-feira, 14 de julho de 2010

A primeira pedra



O assunto é muito sério. Seriíssimo. A lapidação de mulheres é uma prática atroz e o facto de países como o Irão a manterem devia incomodar-nos e indignar-nos a todos. Dito isto, posso, mais tranquilamente, explicar que, como sou um pouco parvo, a odiosa pena sempre me faz recordar a minha anedota preferida, a do lusitano na Galileia, a qual passo, com a vossa licença, a contar: há muitos, muitos anos, ainda nem os romanos se tinham convertido à fé em Cristo, nem Maomé tinha vindo fazer pregações, o lusitano empreendeu uma peregrinação à Terra Santa. Ali chegado após mil aventuras e perigos, calhou-lhe passar pelo Monte da Oliveiras e de ver que ali se ultimavam os preparativos para a lapidação de uma mulher adúltera. Os romanos aconchegavam a mulher na cova aberta num espaço amplo e os homens andavam de nariz no chão, procurando boas pedras para atirar. O lusitano fez o mesmo e encontrou um bom calhau e um sítio ainda melhor. Quando, enfim, foi dada a ordem para que o apedrejamento começasse, Jesus Cristo entrepôs-se gritando e erguendo os braços para o céu. Os agressores suspenderam o gesto e Jesus aproveitou para falar à consciência de todos: “Quem nunca falhou que atire a primeira pedra!”, disse. E o lusitano, tendo ouvido e ponderado, olhou a pedra, olhou a mulher e desferiu uma pedrada no meio da testa da condenada. Indignado, Jesus perguntou-lhe: “O quê?! Tu nunca falhaste?!”. O lusitano encolheu os ombros, abriu os braços e justificou-se humildemente: “A esta distância, mestre?”.