sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
Os Tanner
Não sei como dizer isto sem parecer completamente parvo, mas tem-me custado um pouco ler Os Irmãos Tanner, de Robert Walser, ainda que, de algum modo, me fascine o modo como Walser escreve, transformando os irmãos em personagens torrenciais e um pouco loucas (ou muito loucas, dependerá do grau de destrambelhamento do observador), talvez por serem demasiado livres. Aquelas pessoas são capazes de falar interminavelmente sem cansaço nenhum, analisando todos os possíveis ângulos de um assunto, mesmo que o assunto não interesse absolutamente nada. Invejo a Walser essa capacidade para escrever sem parar, para criar monólogos enormes e contrários a todo a lógica, frases e frases e frases que, às vezes, se contradizem umas às outras. Edwig, por exemplo, diz uma coisa à noite e outra completamente diferente na manhã seguinte, desmente-se, gosta e desgosta, e, ainda assim, sou capaz de respeitá-la. Simon quer hoje ser livreiro e nisso demonstra uma vontade inquebrantável, mas logo tudo aquilo o aborrece. É o mais admirável dos irmãos precisamente por ser o mais desregrado, o mais tolo e o mais improvável de todos. Não considera necessário deixar de apreciar as coisas belas do mundo ou maculá-las com obrigações quotidianas e não se dá ao aborrecimento de pensar no futuro. Anda pela cidade estranhando o ritmo apressado dos outros e perguntando-se por que correm e para onde. Não sei o que irá acontecer com o livro, se vou terminá-lo ou não, mas tenho a certeza de que o mundo seria um bocadinho mais animado se andassem por aí muitos Tanner, indiferentes às calças esfarrapadas, mas apreciando bastante a liberdade que há em caminhar por aí e viver sem amanhã e essas merdas. E depois há a descrição do jovem poeta de fato amarelo, um cadáver no meio do caminho de Simon, em pleno Inverno. Parece a antecipação da morte do próprio Walser.