Sim, Sr. Hulot/Trafic, de Jacques Tati (1971), explora a dialética (as contradições) entre o velho mundo artesanal, do improviso, diletante, e a lógica massificada do capitalismo industrial: uma pequena empresa, de garagem, tenta fazer chegar ao sumptuoso e asséptico salão automóvel de Amesterdão um revolucionário protótipo de uma 4L destinada ao campismo, entre camiões-tir, auto-estradas frenéticas e voos de naves espaciais transmitidos em directo. Nesse momento de transição entre o mundo antigo e o novo, o ser humano, então como agora, persiste (inalterável) na sua essência. Demonstra-o a sequência da fila de trânsito na Bélgica, na qual os condutores se dedicam a tirar macacos do nariz. Hoje, 54 anos depois, em plena ascensão da inteligência artificial e no momento culminante em que se assiste à massificação do Chat GPT, basta passar alguns minutos numa bicha para, olhando para o carro ao lado, constatar que o Homem permanece igual na sua essência: somos animais básicos, e um pouco ordinários, que se entretêm a catar catotas.