terça-feira, 29 de abril de 2025

As notícias do fim do mundo eram francamente falsificadas

 Afinal as notícias (falsas) sobre o fim do mundo eram, outra vez, francamente exageradas. Eu, que sou do tempo em que uma falha da rede eléctrica era apenas uma falha da rede eléctrica, já não tenho idade (nem pachorra) para correr para supermercados, açambarcar papel higiénico e colecionar latas de atum. Caminhei tranquilamente até onde sabia poder encontrar uma Barona fresquinha e sentei-me a ler. Nem meia hora depois, os festejos da garotada alertaram-me para o regresso da luz. O fim da tarde estava glorioso, cálido e a pedir mais algumas cigarrilhas ao ar livre. Depois veio o entardecer, a televisão e a internet. As notícias eram repetitivas e aborrecidas (a SIC chegou ao ponto de fazer um directo com o Ventura, equivalente a chamar um incendiário para ajudar no rescaldo do fogo), pelo que voltei à leitura do costume, aos gestos do costume e à mesmice de sempre, ainda um pouco divertido de ver os aguadeiros improvisados acartando paletes, os devoradores de papel higiénico e os proclamadores do apocalipse transpirando sob os seus exagerados carregos. Foi, de certa forma, melhor do que ir ao cinema ver uma comédia antiga.


P.S.: caso não tenham dado pelas ironias mais refinadas e tragicómicas do dia, o apagão aconteceu porque, a fim de maximizar o lucro dos accionistas, a privatizada EDP estava a importar energia a pataco de Espanha, quando Portugal tem capacidade suficiente para produzir a energia que consome; e as casas com painéis solares (e, portanto, auto-suficientes durante o dia) ficaram também às escuras porque o sistema (que pagaram) só funciona se estiver conectado, via wi-fi, à central gerida pelo monopólio eléctrico que nos rói os ossos.