sexta-feira, 11 de junho de 2010
Cuauhtémoc Blanco ou como ser um encantador paquiderme
O Mundial, enfim, começou; ou começou aquilo que realmente me interessa para lá do folclore pré-orgasmático dos navegantes: a bolinha a correr em campo independentemente da cor das camisolas. Do primeiro jogo guardei o espantoso remate de Tshabalala para o golo da África do Sul e a presença em campo de Cuauhtémoc Blanco, um rapaz de 37 anos e com para aí 90 quilos de peso, que transpirava abundantemente instantes depois de ter entrado em campo, já com a segunda parte a decorrer. Numa competição em que se glorificará inevitavelmente a juventude, o apuro físico, a versatilidade, os abdominais impecavelmente ginasticados, o gel capilar e os brincos de diamante, o lento e gordo Cuauhtémoc Blanco é uma presença absolutamente enternecedora. Primeiro, porque Cuauhtémoc faz lembrar o nome de uma personagem de Os Detectives Selvagens, o magistral romance de Roberto Bolaño. Depois, porque Cuauhtémoc Blanco trata a bola com uma gentileza irrepreensível: não falha um passe e não obriga ninguém a correrias loucas. Comecei, confesso, por estranhar a presença dele em campo, mas acabei rendido. Cuauhtémoc Blanco está simplesmente ali, imperturbável, como um paquiderme antigo ou um cavalheiro de outros tempos. É muito reconfortante ver um homem normal, barrigudo e quase velho, a jogar um Mundial de futebol, indiferente à vaidade dos falsos semideuses. Vejo Blanco em campo ensaiando pequenas corridas lentas para se posicionar e parece que tudo é possível: se ele e o Miguel Veloso lá estão, também eu podia perfeitamente jogar numa selecção.