sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Que força é essa, que força é essa...


Por força da excessiva proximidade física que se estabelece quando um número considerável de pessoas são amontoadas a trabalhar num espaço relativamente diminuto, ouvi esta semana um telefonema de um colega que versava sobre a venda de veículos de marca Porsche em Portugal. A despeito da penúria reinante, a empresa alemã já entregou, só este ano, qualquer coisa como duzentos automóveis aos seus novos donos, tendo ainda mais 150 encomendados, dos quais 55 são do modelo Cayenne em versão diesel (os mais caros). Fiz questão de confirmar os números no fim do telefonema, não fosse dar-se o caso de estar a ouvir mal ou de ter sido acometido por uma espécie de alucinação de classe. Mas era mesmo verdade: a crise no seu estado natural, esvoaçando selvagem sobre as nossas cabeças.

Visto que não podemos esperar nada do Estado, e muito menos que nos defenda ou que exerça algum tipo de arbitragem tendente ao estabelecimento de um limiar mínimo de justiça social (esse mito jurássico), tenho frequentemente dado por mim a cogitar na necessidade de enveredarmos pela acção directa ou por algum tipo de terrorismo com açúcar, que não magoe muito mas chateie substancialmente (para ver se não se chega ao ponto de nos parecer melhor a pura e simples anarquia). Alguma coisa, enfim, como correr a cidade enchendo estes carros, e as casas dos seus proprietários, de autocolantes difíceis de descolar, nos quais se lesse uma simples pergunta: quantos desgraçados custou este carro? Esta casa? A tua vida?