quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Santa Amador fica-me um pouco fora de mão

 Segundo o Expresso, preservam em Santo Amador, no concelho de Moura, uma antiga tradição do Entrudo que consiste em construir um boneco de palha, o Compadre, o qual se dedica a dizer disparates e, por isso, acaba a arder numa fogueira. Parece uma prática muito higiénica e que eventualmente poderia, com certas vantagens, ser aplicada também àqueles que fazem disparates e sobretudo àqueles que acumulam e, ainda assim, agem com sobranceria e até certo desdém. 

Estou certo de que vossas excelências estarão já a pensar em alguns indivíduos merecedores de tal castigo, mas talvez não se tenham ainda lembrado da ministra da Saúde, ineficaz e, ainda assim, grosseira e petulante até à medula, ou dos autarcas de Lisboa e do Porto, Moedas & Moreira de suas graças. 

Senão vejamos: meses depois de Moreira ter lançado um anátema sobre as lojas de recuerdos "de paquistaneses", Moedas decidiu agora imitá-lo e repetir a tirada xenófoba, insinuando que há-de haver marosca e lavagem de dinheiro se tais estabelecimentos pagam sete mil euros de renda sem terem clientes que o justifiquem. Claro que a Moedas & Moreira nunca ocorreu duvidar da origem dos fundos que adquirem apartamentos de luxo à beira-mar ou com vistas de rio, os quais crescem como cogumelos nas respectivas cidades. Para quê? Os empreiteiros que constroem tais esplendores são portugueses e as imobiliárias que os vendem até são de gente "dos partidos". De que lhes interessa, pois, de que países são provenientes os proprietários ou a que ramo de actividade se dedicam?

O noticiário do dia esclarece, por outro lado, que nos próximos tempos vão nascer mais 167 unidades hoteleiras nas duas cidades, 122 das quais hão-de surgir no Porto - na cidade onde quase nenhum cidadão comum consegue comprar casa ou aspirar a tê-la. Pior, todavia, do que imaginar o futuro distópico, mas já não muito distante, de uma cidade que terá um hotel em cada esquina, é perceber que a Câmara do Porto e o seu presidente abdicaram de fazer de conta que têm um plano. Limitam-se a assistir ao regabofe instalado e a permitir que uns quantos embolsem o que podem. Santo Amador fica longe o suficiente para que este compadre tenha de se preocupar com a fogueira.