sexta-feira, 28 de junho de 2013

Das dificuldades da literatura

Percebo agora um pouco melhor os cidadãos escritores que necessitam de um certo retiro a fim de, alienados do rumor do mundo, serem capazes de dedicar o tempo à literatura. Por exemplo: o telefone, hoje, não parou de tocar. Das duas vezes em que me sentei disposto a retomar o labor da ficção, fui interrompido e solicitado, distraído, assim que tive o desplante de iniciar uma frase, logo deixada a meio em absoluto desmazelo, como um jardim por regar e estiolando ao calor que enfim chegou. Não sei quando poderei retomar essa frase, esse trecho de prosa, mas é quase certo que serei, então, uma pessoa diferente daquela que a principiou, o que talvez signifique que aquele começo já nem sequer fará sentido e que, se calhar, terei de voltar ao início de tudo, à frase inaugural, a fim de, com sorte, ser capaz de recompor o trajecto enviesado que ali me trouxe. O livro, se livro chegar a ser, estará já tão distante da ideia que o semeou que, no fundo, será como se tivesse sido escrito por turnos e por gente que nem sequer conheço.