quinta-feira, 30 de maio de 2013

A ver o tempo passar



Não ia ao miradouro do Jardim 9 de Abril, em Lisboa, desde Outubro ou Novembro de 1989.
Estava, então, um dia escuro e ventoso, uma tarde agreste e a ameaçar chuva, e cheguei até ali levado pelo Pedro Rosa Mendes. Descemos, depois, a escadaria até à 24 de Julho e fomos caminhar pelo cais e conversar. Eu levava, lembro-me bem, uma gabardina bege e comprida como os detectives dos filmes policiais, a qual devia assentar-me como num pau de vassoura.
Mais tarde, não sei porquê, associei o sítio a uma das cenas do romance O Ano da Morte de Ricardo Reis, do José Saramago, a qual, se calhar não tem nada a ver com aquele ponto das margens do Tejo, mas nunca mais ali tinha voltado.
Quando anteontem, caminhando sem rumo fixo, fui parar outra vez diante do Museu Nacional de Arte Antiga, recordei-me imediatamente daquela tarde de Outono e de lá ter estado há quase 24 anos, e também dos sonhos que tinha, os que concretizei e os que perdi pelo caminho. Desta vez, a despeito de ter aprendido a moderar as expectativas para o que me falte viver, não havia vento nem nuvens escuras sulcando o céu, antes uma esplanada, sol e jacarandás em flor diante do Tejo. Bebi uma cerveja preta e deixei-me estar a ver o tempo passar.