sábado, 27 de abril de 2013

Respeitinho que o energúmeno está a ver


(fotografia da página de Paulo Mendes no Facebook)

Isto é chover no molhado: Rui Rio já ganhou três eleições e creio que ganharia ainda mais algumas se a lei não o impedisse de concorrer. O povo é que o é — e o do Porto não é diferente, por exemplo, do da Madeira.

A despeito da inutilidade de tudo o que se escreva sobre o indivíduo a quem Augusto M. Seabra justamente apelidou de "energúmeno", foi com alguma surpresa que soube que a empresa municipal Porto Lazer decidira investir (ou "fazer uma despesa", de acordo com os preceitos de Rui Rio) na abertura efémera de um edifício dedicado a actividades culturais. Rio nunca escondeu uma antipatia primária pela cultura e só os de fraca memória se deixarão enganar pelas operações de charme dos últimos anos (aqueles em que Rui Rio começou a achar que era possível chegar mais alto e a cogitar que talvez o Terreiro do Paço torcesse o nariz a um boçal inculto orgulhoso de o ser).

Embora inaugurado na mesma semana em que se soube que a Câmara do Porto recusou gastar/investir 75 mil euros na realização da Feira do Livro, cancelando o evento pela primeira vez em mais de 80 anos de história, o projecto Primeira Avenida concitou imediatas simpatias. A ideia de aproveitar um dos vários edifícios devolutos da Avenida dos Aliados para uma utilização cultural entusiasmou jornais e televisões, que deram ampla cobertura à surpreendente extravagancia de Rui Rio, inaugurada com foguetório a preceito.

Estranhei, desde logo, que o edifício tenha sido ocupado por instituições que já dispunham de outros espaços na cidade para desenvolver o seu trabalho, sabendo-se, como se sabe, que há inúmeros criadores do Porto que não beneficiam desse luxo. A notícia de que os responsáveis pela Primeira Avenida mandaram retirar da fachada uma das intervenções artísticas ('Portuguesa Monochrome', de Paulo Mendes, uma bandeira nacional a preto e branco a meia haste) recoloca, porém, as coisas no seu devido lugar. Rui Rio e os seus apaniguados até estão dispostos a tolerar a cultura se os artistas se portarem bem e estiverem dispostos a vergar a cerviz.

Qualquer pessoa que não tivesse chegado de Marte há 15 dias facilmente poderia antecipar que seria apenas uma questão de tempo para que uma coisa destas acontecesse. Rui Rio tem alma de censor e dificilmente é capaz de o disfarçar. Apenas se estranha que algumas pessoas ligadas à cultura do Porto ainda estejam dispostas a dar o benefício da dúvida e a colaborar com alguém que já os insultou tantas vezes.

Vendo bem, a 'Portuguesa Monochrome' é o melhor símbolo que a cultura do Porto podia ter.