sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A verdade na boca dos tolos

De acordo com um provérbio patusco que, por acaso, encontrei com a ajuda do Google, a língua dos sábios adorna a sabedoria, mas a boca dos tolos derrama a estultícia. Colocado perante esta evidência, vacilo: como hei-de classificar a mulher um pouco tresloucada que ontem vinha no autocarro ao final da manhã? Falava como um tolo, em voz alta e sem controlo aparente, mas dizia grandes, insofismáveis verdades, como aquilo de os políticos se dedicarem a roubar os que o não são, todos sem excepção, o Soares, o Cavaco, o Passos e o Relvas, cujas férias no Brasil se transformaram em motivo habitual de conversa e rancor entre alguns dos utentes dos transportes públicos — a despeito de, segundo a mulher, o povo estar anestesiado e incapaz de reagir aos insultos e assaltos dos governantes. "Governantes, aquilo?", volvia a mulher. "Nem a casa deles governam. Governar com o dinheiro dos outros também eu fazia". Depois, na Rotunda da Boavista, a sábia mulher levantou-se e saiu com o ar mais normal do mundo, como um oráculo no fim do expediente. Dentro da viatura, uma das senhoras com quem ela vinha conversando resumiu tudo: "Ai é tão engraçada, a senhora".