sexta-feira, 2 de março de 2012

Ó para os velhotes a gozar comigo


A atenção é um mecanismo muitíssimo subjectivo. Desde que me vi obrigado a usar muletas para me locomover que não paro de reparar na enorme quantidade de pessoas que por aí andam de canadianas. Para qualquer lado para onde olhe lá vão eles agarrados às muletas, um velho e mais outro, e ainda outro, e outro, só num autocarro onde entrei há dias éramos três pessoas naquele triste preparo, ao ponto de me parecer que toda a gente decidiu ser solidária com a minha dificuldade de locomoção, ou que, então, estão a gozar comigo, ou com quem pode caminhar sozinho, como na velha anedota dos gagos. É uma coisa bestialmente inquietante, mas creio, ainda assim, que não chegaria a partilhar esta paranóia inconsequente se não tenho visto que até na primeira página do Público de hoje aparecia uma fotografia de dois velhotes com muletas, José e Rosa, os quais alegam viver num contentor há não sei quanto tempo, embora seja muitíssimo claro, e basta olhar-lhes para a cara, que eles só estão na capa do jornal para mangar comigo.